Quando digo às pessoas que simplesmente “deu a louca” e fui embora de São Paulo, acham que sou insano ou inconsequente. Longe disso. Procurava paz, tranquilidade e um lugar bom para se viver sem as neuras e loucuras da grande metrópole.
Tudo bem, sei que existem pessoas que amam esta loucura toda e não as julgo ou culpo por isso. Cada um tem um ritmo, um jeito, um desejo na vida e cada um sabe onde o calo aperta. Para alguns, a grana ou ainda a vida agitada é algo primordial. Para outros, tais como eu, o inverso é verdadeiro.
Mas algo interessante para a leitura é o texto a seguir que encontrei nas andanças pela rede. Faz pensar aqueles que muitas vezes me chamam de maluco ou acham que eu estou errado quanto as escolhas. Pense a respeito.
“Ocupe-se de pouco para ser feliz.” Foi essa a primeira frase de um livro de Demócrito, filósofo grego do século V a.C. O livro se chama Sobre o Prazer, e não chegou à posteridade senão por citações de outros pensadores. A palavra grega para tranqüilidade da alma é euthymia, e sobre ela se debruçaram intensamente os sábios. A recomendação básica de Demócrito, sob diferentes enunciados, é encontrada sempre. Sobrecarregar a agenda equivale a sobrecarregar o espírito, e traz inevitavelmente angústia. Ninguém que tenha muitas tarefas, ou que se atribua muitas, pode ser feliz.
Um homem sábio da Antiguidade não abria nenhuma correspondência depois das 4 horas da tarde. Era uma forma de não encontrar mais nenhum motivo de inquietação no resto do dia, que ele dedicava a recuperar a calma que perdera ao entregar-se ao seu trabalho. Se olharmos para nós, nos veremos com freqüência abrindo mensagens no computador alta noite, e não raro nos perturbando por seu conteúdo. O único resultado disso é uma noite maldormida.
O fato é que fazemos muitas coisas desnecessárias. Coloque num papel as atividades de um dia. Depois veja o que realmente era preciso fazer e o que não era. Já fiz isso. A lista das inutilidades suplantou sempre a das ações imperiosas. O imperador filósofo Marco Aurélio, do começo da Era Cristã, louvou a frase de Demócrito em suas clássicas Meditações. Acrescentou, com sagacidade, que devemos evitar não apenas os gestos inúteis, mas também os pensamentos desnecessários. Marco Aurélio recomendava o formidável exercício de conduzir a mente, quando desviada, para pensamentos relevantes. Isso conseguido, à base de perseverança, controlamos a mente, esse cavalo selvagem, em vez de sermos controlados por ela.
Ninguém escreveu com tanta graça sobre o tema como Sêneca, pensador romano também dos primórdios da Era Cristã. Sêneca usou as expressões ‘agitação estéril’ e ‘preguiça agitada’ ao tratar dos atos que nos trazem apenas desassossego. ‘É preciso livrar-se da agitação desregrada, à qual se entrega a maioria dos homens’, escreveu Sêneca. ‘Eles vagam ao acaso, mendigando ocupações. Suas saídas absurdas e inúteis lembram as idas e vindas das formigas ao longo das árvores, quando elas sobem até o alto do tronco e tornam a descer até embaixo, para nada. Quantas pessoas levam uma existência semelhante, que se chamaria com justiça de preguiça agitada?’
Agimos como formigas quase sempre, subindo e descendo sem razão o tronco das árvores, e pagamos um preço alto por isso: ansiedade, aflição, fadiga física e mental. Nossa agenda costuma estar repleta. É uma forma de fugir de nós mesmos, como escreveu sublimemente um poeta romano. O resultado é inquietação. Eliminar ao menos algumas das tantas tarefas inúteis que nos impomos a cada dia é vital para a euthymia da qual falavam os sábios gregos. Quem busca a paz fará bem em refletir na frase com a qual Demócrito iniciou um livro que, tamanha era sua força, sobreviveu aos séculos, ainda que com base apenas em citações.
Fonte: Revista Época