Este é o segundo capítulo do diário de bordo de minha última viagem. Aqui são descritos os acontecimentos e aventuras desde minha saída de Dili, capital do Timor-Leste até a chegada em Frankfurt, na Alemanha mas divididos em duas partes devido a extensão do post.

Se você perdeu o primeiro capítulo desta epopéia, clique aqui e mantenha-se atualizado. Ao todo a “novela” está dividida em vários capítulos com informações e passagem para rir e chorar (também de rir). Aproveite!E chegou o primeiro de agosto. Na noite anterior, ao contrário da maior parte das pessoas, dormi de fazer remela. Meu roommate iria desta vez me acompanhar até Frankfurt onde, de lá, iria para a Irlanda e depois ao Brasil. Desta forma, deixei para ele a preocupação de acordar cedo. Minha “mochila-outdoor” já estava pronta, passaporte verificado, todos os documentos necessários impressos (passagens, mapas de sistemas de transporte, reservas de hotéis, tickets de trem, etc) e claro, as roupas. Só ficou faltando pegar a grana no “cofre” e colocar as baterias e carregadores da tralha eletrônica na mochila pequena. Então, nada de acordar cedo porque o dia seria longo, bem longo.

Saímos de casa as onze e meia da manhã com um sol de rachar. Chegamos no aeroporto de Dili em vinte minutos e já começamos o despacho das malas. Só para variar, Marcelo acabou pagando excesso de bagagem pois, dos quinze quilos permitidos, estava com quase quarenta. Fizemos a alfândega e começa a primeira espera. Infelizmente o aeroporto de Dili é pequeniníssimo e atualmente em reforma, não possui um único local para tomar um café. Então o negócio é esperar sentado na sala de embarque para não morrer de insolação do lado de fora.

Com um atraso de dez minutos, embarcamos num vôo de uma hora de dez para Bali. Por um azar daqueles, nos deram as últimas poltronas do avião que, além de ser mais velho que meu umbigo, o ar não funciona e faz um barulho danado. Juntado tudo isso mais a cadeira que não reclinava e a famosa “gelatina Merpati”, tentamos fazer aquele primeiro vôo com esperança, afinal, depois de três meses, estávamos novamente indo para a civilização. Como de costume, foi o avião levantar e eu apagar, acordando somente quando senti o cheiro da caixinha laranja chegando.

Chegando em Bali, percebi que Marcelo olhava preocupadamente para a pista do aeroporto e questionei o que estava pensando. Ele me confidenciou que, por um azar daqueles, os vôos de Dili chegam sempre quinze minutos depois de um jumbo da China Airlines proveniente de seu país com… quatrocentros chinas! Neste momento gelei pois, na Indonésia, o visto é fornecido no desembarque (on arrival) depois de uma demora secular. Com quatrocentos chinas na nossa frente, seria mais uma longa espera. Passo então à procurar também o jumbo que seria a nossa tristeza ou felicidade naquele momento e, ao longe, vejo aquele imenso pássaro de aço encostando. Comecei a rezar para tudo que é santo que conhecia para chegássemos no saguão antes do estouro da boiada. Acredito que a reza foi boa pois, mesmo com o saguão cheio, levamos “somente” uma hora para dar entrada na Indonésia. Se tivéssemos pego o bando que chegou logo depois, teria sentado ali mesmo para perguntar à Deus porque estava sendo tão cruel em momento tão feliz.

Bali
Estátua em BaliBali é mística, é bonita, é interessante e é louca! A loucura já começa na saída da porta de desembarque onde uma legião de taxistas avançam em você como urubu na carniça. Muitos faltam se esbofetear em sua frente e não raro é quando arrancam a mala de sua mão para enfiar no carro. Algo que nunca tinha visto em lugar nenhum do mundo.

Estávamos lá somente para uma escala, pegando outro voo as 8 da noite daquele mesmo dia. Como ainda eram duas da tarde (uma hora a menos que Dili), resolvemos ir na Seminiak Road fazer compras. Esta rua é considerada uma quase Oscar Freire de Bali. O que tem de mais bonito e mais caro, lá está. Caro em termos pois com a cotação da rúpia (moeda indonésia) no fundo do poço, qualquer coisa se torna barata.

Deixamos nossas malas no locker do aeroporto e pegamos um Bali Táxi até a dita rua. Como não tive coragem de comer a gelatina da Merpati, estava com o estômago nas costas e com uma sede daquelas. Paramos em uma esquina no começo da rua onde tinha um café, pedimos uns pães com salame e aproveitamos para acessar a Internet, gratuita para os consumidores do local. Meia hora depois, já estávamos caminhando pelas calçadas estreitas vendo todo o tipo de assédio a carteira: estátuas de madeira trabalhada por doze dólares, conjuntos de quadros por vinte, bolsas, roupas, bijuterias e todo o tipo de artesanato. Numa loja muito bonitinha, compramos porta-incensos em formato de prato muito bonitos e por bom preço. Continuamos a caminhada e, em cada esquina, um mini-templo ou ainda um templo gigante para ser visto e admirado.

A cultura de Bali é muito diferente do restante do país. De raízes hindus, os três milhões de balinenses são tranquilos (em comparação aos de Jakarta), amáveis e muito, muito criativos. As obras de arte que são feitas por eles, as pinturas e o gosto pelo amarelo, vermelho e dourado é algo que impressiona. Também impressiona a ânsia que possuem na Indonésia por estátuas. Uma maior que a outra, uma mais megalomaníaca que a outra. Da mesma forma que os templos, as estátuas seguem o padrão do “quanto maior, melhor”.

Tarde em BaliMas isso que faz Bali ser muito interessante. A mistura de povos, de culturas e a quantidade absurda de turistas vindos de tudo que é buraco do mundo permitem que o caldo da ilha se torne o mais interessante possível, fornecendo para quem a visita um conjunto de sensações inexplicáveis e imagens das mais bonitas possíveis.

Depois das compras, outro táxi para o aeroporto, pegar as malas e ir embora. No caminho entre os dois terminais (internacional e nacional), resolvi passar no escritório da AirAsia, companhia lowfare que iria nos levar até Jakarta para verificar minha passagem. Qual não foi a surpresa de, lá chegando, saber que meu voo tinha sido cancelado? Chateado com isso, tentei mudar o bilhete para o voo de Marcelo a fim de não ficar “boiando” em Bali. Depois de uma boa conversa, lábia e cara de menino perdido, a atendente arrumou um lugar no mesmo voo e confirmou as passagens. Tanto melhor pois assim iríamos gastar somente um táxi até o hotel em Jakarta, que fica no fim do mundo.

Jakarta
Chegamos em Jakarta as 8 e meia da noite (menos uma hora de Bali) e logo que desembarcamos pudemos sentir a diferença entre as duas ilhas. Ao contrário de Bali, Jakarta é uma verdadeira zona urbana misturada com um frenesi enlouquecedor de sua população. Fomos abordados por dezenas de taxistas (novamente), os quais não queríamos seus serviços. Explico: táxi na Indonésia é algo extremamente barato. Paga-se por uma corrida de aproximadamente 50 quilômetros, coisa entre 8 e 10 dólares. Mas existe um problema: sabendo disso, taxistas inescrupulosos ficam passeando com você durante horas, fazendo-se de bobo e fazendo você de bobo. Como a maioria da população não fala nada além de bahasa e seus dialetos, travar uma conversação com um taxista é algo cansativo. Então, preferimos uma grande companhia chamada Blue Bird Group. As vantagens de seus táxis são muitas: são padronizados (normalmente em azul metálico), os motoristas entendem algumas vírgulas a mais de inglês, não ficam fazendo perguntas cretinas, cobram o justo e o ar-condicionado funciona. O ruim é que não se pode fumar dentro do carro mas é algo totalmente suportável pela tranquilidade da corrida. Mas claro, os concorrentes não suportam perder corridas para outrem e fazem todo o tipo de proposta indecorosa para o cliente. E nós quase caímos em uma.

Aeroporto de JakartaNa frente da saída do desembarque ficam os taxistas e algumas “tendinhas” com uma plaquinha em cima e um carinha estranho sentado. Aquilo pressupõe-se que é um ponto de táxi ou algo semelhante. Tentando sair da muvuca de motoristas, parei em um destes e perguntei quanto ficava a corrida até o hotel. Rp: 130.000,00 Achei caro e ele baixou o preço até que estivesse condizente com o que tinham me dito em Bali. Quando o táxi chegou, não tinha nada que caracterizava o carro como táxi. Na verdade, era um amigo do cara (pressupõe-se) que estava lá fazendo um bico. Neste momento pulamos fora e começamos uma discussão porque ele já queria colocar as malas no carro. Simplesmente não iríamos naquele carro. Não sabíamos o que era e tampouco tínhamos garantia que iríamos chegar no hotel. Depois de cinco minutos de discussão e alguns xingamentos em português, pegamos as malas e embarcamos em um táxi de verdade para uma corrida de cinquenta minutos (puta lugar longe).

Enfim, chegamos no hotel mas as aventuras ainda não tinham terminado por aquele dia. Dias antes tinha enviado um e-mail para o hotel pedindo a troca da cama de casal por duas de solteiro pois iria dividir o quarto com Marcelo. Quando chegamos no hotel, um Mercure quatro estrelas, o quarto somente tinha a cama de casal, não tinham recebido o e-mail (conversa) e ainda por cima queriam cobrar o preço de outro quarto para colocar uma cama de solteiro no meu. Toca chamar o gerente, explicar o erro que eles cometeram e dar uma “carteirada” no mesmo. Não gosto disso e não acho que preciso mas quando o mesmo viu minha carteira da ONU junto com meu passaporte, deve ter pensado duas vezes no que estava fazendo e arrumou uma cama “gratuita” para o meu quarto (que depois se mostrou mais cara do que se tivesse pagado o quarto para ele) e também convites para “drinques” no bar do hotel. Que mané drinque o quê, eu estava é com uma baita fome e já tinha visto, quando passamos de táxi, um restaurante na esquina do hotel. Resolvemos ir jantar e lá comemos um famoso pato laqueado. Esta iguaria chinesa e tão comentada por Marcelo é um pato fatiado mas que a pele toma um banho de alguma coisa e fica toda dura, crocante, como se fosse uma pururuca de pele de porco. Além disso, sua aparência lustrosa remete o observador a pensar que o mesmo foi passado no laquê (sempre fiquei imaginando a mãe da Magda do Sai de Baixo com todo aquele laquê na cabeça, sendo servida numa bandeja :-)

De barriga cheia e com algumas cervejas na cuca, tome cama para o dia seguinte que seria de muito bater perna atrás de eletrônicos que queríamos comprar. Tinha visto alguns sites na Internet com bons preços de eletrônicos e resolvemos fazer esta parada estratégica em Jakarta para estas compras. Infelizmente, um engodo só que será contado no próximo capítulo.

Observação: algumas das duas mil fotos desta viagem podem ser vistas em meu álbum clicando-se aqui.