No domingo passado fui até a Ilha de Atauro, um pedaço de terra timorense que fica defronte a cidade de Dili distante 25 quilômetros da costa. Na companhia de meus amigos Hélio e Claudia, resolvemos passar um domingo diferente conhecendo o lugar, já que Dili pouco oferece de opções nos finais de semana.
Oito horas da manhã já estava eu e Cláudia, uma brasileira/portuguesa que também trabalha no Ministério da Justiça, no porto esperando a saída do Atauro Express, um ferry-boat usado tanto para fazer esta travessia quanto para ir até o enclave timorense na Indonésia chamado Oecussi, distante 12 horas de viagem pelo mar. Previsto para partir as 09:00 da manhã, também esperávamos mais um dos desbravadores malais, nosso amigo Hélio, um paraibano bom de conversa que trabalha no parlamento timorense. Acima de nossas cabeças, o sol prometia um calor enorme e o vermelhão da pele queimada que não tardou a se apresentar mesmo com a utilização de bloqueador solar (acredito que tenhamos que mudar o fator de proteção para 2 milhões a fim de aguentar o sol).
Chegando nosso amigo e o barco ainda sendo carregado para a viagem (nele levam de tudo, desde pessoas até macacos, cabras e galinhas), resolvemos tomar um café no Hotel Timor e comprar algumas garrafas d’água (culpa do sol). Mais alguns minutos de conversa e estávamos a caminho da ilha, sendo nós e uma suíça que vive na ilha os únicos estrangeiros no barco. Uma viagem interessante se não fosse pelo vento no canal que criava ondas dignas de serem dropadas que faziam a embarcação parecer um grande liquidificador (para quem enjoa com facilidade, não é recomendável). Como fazia tempo que não ia para o mar, resolvi ficar em pé para aguentar com mais facilidade este balanço e não acabar tão verde quanto a cor da água que nos esperava do outro lado.
Passadas três horas de viagem (e que viagem!) chegamos a Maumeta (ou Vila), um vilarejo onde está o local para o ferryboat atracar (um cais?) e também a maior vila da ilha.
A Ilha de Atauro
Esta ilha de origem vulcânica é um subdistrito de Dili e possui algumas particularidades como por exemplo ter, ao contrário da maioria do país, boa parte de sua população (cerca de 8 mil pessoas) como seguidores da religião protestante, ao contrário da católica. Isso aconteceu devido a uma missão holandesa que no começo no século XX se instalou na ilha. Além disso, esta ilha foi usada como presídio pelos portugueses e logo depois do início da invasão indonésia, o governador português se refugiou na ilha fugindo desta invasão.
Nela simplesmente existe… nada! Isso mesmo, nadica de nada. Existem algumas vilas ao redor da orla mas que não possuem nenhuma infraestrutura, seja de saneamento, seja de iluminação (a propósito, a luz existe somente entre 18:00 e 06:00 e aos domingos entre 06:00 e meio dia), saúde ou alimentação. Se Deus esqueceu de algum povo do mundo, este certamente é um deles. O “mercado” existente são algumas lonas no chão de Maumeta onde são encontrados produtos básicos (arroz, feijão, sabonete, etc) e varais onde são dependurados peixes e outros animais marinhos secos e salgados como em qualquer civilização primitiva que não possui refrigeração.
Logo na chegada a natureza dá seu show. Uma faixa enorme de corais dividia a praia de águas calmas e sem ondas em diversos tons de verde e azul, formando matizes de cores impossíveis de serem descritas ou fotografadas em toda a sua beleza. Saímos do barco (ainda meio variados devido ao balanço) e fomos caminhando pela areia até uma pequena pousada de um australiano que lá se instalou depois que sua missão encerrou. Como típico hippie das praias brasileiras, Berry pouco se importa com o tempo ou progresso, certeza esta que tivemos somente pela existência de um aparelho celular e uma televisão, os únicos confortos a que se submete. Nesta pousada resolvemos parar para deixar nossas coisas a sombra de uma choupana e tomar um banho de mar, o meu primeiro na Ásia, tomando o devido cuidado para não pisar em nenhum coral e rasgar a pele em suas estruturas calcárias que são verdadeiras navalhas afiadas. Um dos motivos pelo qual também de escolhermos este local é que não tínhamos certeza absoluta do horário de retorno do barco, o qual poderia variar de acordo com a maré ou ainda os ventos. Assim sendo, não queríamos ter a surpresa de passar por um “esqueceram de mim” e ter que acionar um helicóptero da ONU para nos resgatar (seria o mico do mês certamente comentado em todos os locais).
Passa o tempo e claro, bate a fome. Mas… o que comer? Não existe nenhum restaurante na ilha e Berry não estava muito a fim de sair de sua rotina para servir o almoço para três “malais”. Diante disto, Hélio como “menino prendado”, trouxe sanduíches de pão e queijo, os quais comemos com água. Um almoço digno de quem não conhecia o lugar e adepto do “PDI – Programa de Índio”. Depois disso, resolvemos voltar pois já estavam embarcando víveres e outras coisas dentro do ferry, sinal que em breve iria zarpar. Além disso, estávamos os três mais vermelhos que lagosta devido ao sol do começo da tarde e certamente não seria muito inteligente sofrer de insolação em tal local.
A volta
Demos uma volta na “vila” até a saída do barco, o qual chacoalhou diferentemente desta vez, fazendo um balanço “gangorra” com as ondas que se formavam no meio do canal. Eu me segurava como podia tanto com o estômago quanto fisicamente. Já próximos a Dili, o sol começa a descer no mar mas infelizmente não foi desta vez que consegui uma foto dele se pondo no oceano. Entretanto devido a levantar depressa demais para tirar algumas fotos da cores e desenhos do céu, enjoei e tive que botar para fora a água que tinha tomado. Interessante foi que só veio a água. Um mistério descobrir onde foi parar o pão e o queijo.
Algo me deixou encucado na viagem; os residentes da ilha dormem no convés do barco sem a menor preocupação com o balanço que é capaz de tirar de prumo qualquer cristão. Simplesmente deitam-se sobre as cadeiras e dormem um sono profundo que nem mesmo as maiores vagas conseguem acordá-los. Não sei o que possuem (ou não possuem) para ter esta capacidade, a qual invejei duramente devido a fome, a demora da viajem e claro, o liquidificador em que estava sendo jogado de lá para cá.
Atracamos as 19:00 horas e resolvemos voltar ao Hotel Timor (distante 100 metros do porto) para um almoço/janta antes de voltar para casa. Findo o mesmo, alguns minutos de caminhada já estava de retorno ao “lar” para um “banho de tirar craca” e claro, uma cama que não lembra nem de longe as cadeirinhas que os timorenses descansam no barco.
Um passeio lindo e que traz, além das imagens maravilhosas desta parte da Ásia, mais uma vez a certeza que este povo consegue vencer qualquer adversidade, seja esta natural ou não.
Vítor Baptista
08/03/2007 — 23:42
Fala Paulino! Não sei se você ainda se lembra de mim, mas “fiz” uns trabalhos com você há algum tempo.
Bem, cara… descobri há pouco que você foi pro Timor. Que legal! Até fui atrás do site da UNV ver como funcionava para, quem sabe, algum dia, me candidatar a um trabalho voluntário assim. Ainda bem que existem pessoas altruístas a esse ponto no mundo. Ponto pra você!
Parabéns pela atitude. Mesmo.
Boa sorte por aí! Vou acompanhar esse teu blog agora.
Tudo de bom pra ti.
Ah! Quase esqueci de falar. Sobre o pessoal dormir no barco. Cara, isso eu descobri meio que “na marra”, quando tinha ido com uma ex-namorada num barco para ela mergulhar em algum naufrágio aqui na costa de JP. Como eu não mergulho, fiquei no barco. E, como era de se esperar, passei mal pra caramba. Depois de muita gente me aconselhando, resolvi me deitar no chão do barco. E não é que funciona?!
Realmente você enjoa BEM menos(ou não enjoa). Eu consegui dormir ainda!
Então, fica aí a dica. Caso você esteja passando mal nessas situações, se deita. Melhora bastante.
Abraços.
Rute Silveira Fogaça
02/02/2007 — 15:27
Estou curtindo muito lendo estes artigos, pois meu filho e nora estão se preparando para ir para o Timor nos próximos dias
Dani
01/02/2007 — 19:32
No dia que colocou o texto, não pude lê-lo e depois, ele tinha sumido!! É isso mesmo! Ia até comentar contigo, mas durante a conversa, esqueci!! hehehe
Muito gostoso ler tudo e ver as fotos!
Beijo enorme!
alida
01/02/2007 — 17:48
Adorei as fotos!!!
Adorei o relato!!!
Vc deveria ter estudo turismo mesmo!!1rsrsrsrsrsrs
Tô brincando…
Deve ter sido muito interessante essa viagem!